10 de agosto de 2009

Literatura 1.1

Senhores, boa noite.

Seguinte, terei que fazer meio post por semana, que estou com um trabalho bacana pra fazer e o tempo está todo investido.

Mas dá para escrever meia postagem de vez em quando.

Então, como eu tinha prometido e vou ter que cumprir atrasado, vambora resenhar mais três livros.

Vamos começar com The Portrait of a Lady, por Henry James. A impressão inicial é de algo meio parnasiano, com todas aquelas descrições ultra-detalhadas e maneirismos estilísticos. Na seqüência, você começa a achar que está lendo uma obra da primeira fase do Romantismo, com aqueles personagens todos tããão perfeitos e nobres. Mas depois que você conhece melhor a Isabel e se familiariza um pouco mais com o Ralph Touchett, percebe que está diante de um autor que gosta de trabalhar sutilezas psicológicas e filigranas emocionais.

Tudo construído com cuidado, como uma partida de xadrez. Cada personagem tem um papel a cumprir, por mais aparentemente inútil que possa ser no começo (Henrietta Stackpole é o exemplo máximo de personagem que você só vai perceber que é necessário para o desenrolar do livro lá pelo final, onde só ela mesma poderia cobrir a função que ela cobriu).

Resumindo beeem resumido, é a história de uma personagem que se lascou-se sozinha por si mesma própria. Pelo menos ela percebe isso e se porta com dignidade, temos que admitir. Gosto de personagens coerentes.

Outro ponto interessante do livro é que, embora alguns personagens sejam claramente "planos" (pelo amor do milho, alguém me explique o que é aquele Caspar Goodwood!), os vilões são deliciosamente matizados em tons de cinza. Descobrir que Gilbert Osmond é o oposto diametral de tudo aquilo que ele prega, e perceber que se ele visse a própria alma no espelho seria capaz de morrer de desgosto com a breguice do que veria, simplesmente não tem preço. Já Mme. Merle é uma das melhores anti-heroínas que já vi em muito tempo.

Continuando com os spoilers, saber só lá pelo fim do livro que Mme. Merle é a mamãe de Pansy é outra surpresa de virar a cabeça do leitor de avesso. Já vi pai largar filho com a mãe, mas mãe soltar filho na mão do pai, e nas condições em que a gente ver acontecer no livro, é uma senhora surpresa.

Mas analisando nossa personagem principal, digamos que Henry James passa a impressão de ser um tremendo dum machista. Super discreto, elegantíssimo, demora-se meio livro a se perceber isso, mas temos a nítida impressão de ser ele de um machismo cruel. A Isabel se lascou por conta própria simplesmente por ser "uma mulher que quer tomar conta do próprio nariz".

Vejam de onde me pareceu isso: ela rejeitou dois excelentes partidos por que ao casar deixaria de ser uma pessoa com valor individual por si mesma (Isabel Archer) e passaria a ser "apenas" a Mrs. Goodwood ou a Lady Warburton. Quando seu primo Ralph resolveu, muito inocentemente, lhe dar asas a ver o quão longe voaria, caiu direitinho na arapuca de Merle e Osmond, com um sorriso nos lábios, crente que estava abafando!

Pois muito bom, casou por amor e espírito de nobreza com um cidadão que, além de aproveitador, parasita e ingrato, ainda passou a dedicar sua existência a destruir o espírito dela. Pffft... Sente-se como se Henry James dissesse a sua protagonista, mais ou menos ao longo dos 10 últimos capítulos, rei-te-ra-da-men-te: "Bem feito, mulherzinha! Quem mandou querer ser independente? Agora toma! Bem-feei-tooo! Lá-lá, lá, láá, láá... lááá!!!".

Mas a uma leitura mais atenta, compreende-se que é exatamente o contrário. Por que é essa saraivada toda contra o espírito dela, mas Isabel segue até o amargo fim ali, firme, suportando tudo com um estoicismo espartano. O modo como ela aprende a contornar Osmond ao estilo zen ("Água não passa por cima de pedra, dá a volta") e salva as peles de Pansy e de Lord Warburton de caírem de focinho em um casamento arranjado que os mataria de aborrecimento por toda a eternidade é de um brilhantismo a parte.

E o final, então, é para aplaudir em pé. Despachar Caspar depois de todas as cartas na mesa e voltar para sofrer as pedradas e flechadas do destino adverso por amor à decência, à integridade de seu espírito e talvez até em sacrifício pela INOCENTE ÚTIL que é a coitada da Pansy foi encerrar o livro com fecho de ouro!

Agora, a dois livros não tão bons, embora clássicos. Duas obras seminais no gênero terror, mas que atualmente só têm valor histórico.

A primeira é o "Drácula" original, de Bram Stoker. Personagens planos e mal construídos, Drácula caricato, "noivas do Drácula" jogadas ali a esmo como um pedaço de roteiro mal costurado e trechos efetivamente blasfemos.

Ora faça-me o favor, então usa-se "massa de hóstia consagrada" para fazer "círculos" ou "barreiras" de proteção, como se fossem os círculos mágicos de conjuradores de demônios? Tenha a santa paciência, quase larguei com o livro pela janela quando cheguei nessa parte...

Fora isso, o comportamento das moças é histérico e o do herói do livro mais ainda. O único personagem interessante foi o de uma moça que, virando vampira, andava com crianças pela noite a la Michael Jackson mas não as "bebia".

A segunda é o "Frankenstein" original, de Mary Shelley. O livro é decididamente EMO!
Dr. Victor Frankenstein era um emo patético que desmaiou como uma menininha quando seu monstro se ergueu, animado pelos relâmpagos.
A família "protegida" pelo monstro é uma família de conto de fadas, todos de uma bondade de comercial de margarina.
E o "monstro", Ah, senhores!, o "monstro" é um capítulo à parte.

Vêm ao mundo com "alma" de criança, sem saber falar e sem noção de fanta-uva na vida. Até aí óquêijo, tudo belesminha. Afinal, apesar do tamanho monstruoso e das formas grotescas (foi montado com peças de gigantes ou o quê?), era um "recém-nascido" (ou "recém-morto-vivo", sei lá).

Mas ao parar na cabana ao lado da família de camponêses pobres que ele resolve ajudar e proteger (índole quase angélica, muito mais humano que aquele arremedo de nobre que é o Dr. Frankenstein), aprende rapidamente (só de ver e ouvir) a falar, ler e escrever, tocar flauta e filosofar como um verdadeiro filósofo teórico alemão. A única explicação que me vem à mente é que o Dr. tenha acidentalmente pego o cérebro de um luminar da ciência ou de um grande pensador e com o tempo as memórias residuais tenham começado a vir à tona, reativadas.

Até aí, está tudo mais ou menos bem estruturado, mas aí o "monstro" (cafiaspirina cruz, queria que a Sra. Shelley tivesse dado um nome para ele, por que é de longe o personagem mais humano do livro inteirinho) descobre que não tem lugar para ele no mundo, já que as pessoas (mesmo as melhores) tem uma tendência desagradável a julgar livro pela capa e a encadernação dele é realmente das piores.

Numa decisão de uma sabedoria espantosa, resolve que quem faz a agada é quem tem a obrigação de limpar, e parte em busca de seu criador, para que ele dê um jeito na baderna.

Só que dá azar ao encontrar com o irmão mais novo do Dr., e o moleque acaba morrendo toscamente. O monstro sai de fininho, no melhor estilo "Filho feio não tem pai", e acaba sobrando para uma moça lá do feudo. No pior estilo "comédia de erros", só que dessa vez é tragédia de erros, mesmo.

Daí o Dr. vai tirar satisfação com o monstro, achando que a criatura tinha matado o moleque e incriminado a moça de propósito. Ao encontrar o monstro este, muito lhanamente, conta todas as suas desventuras até o momento e pede uma "Eva" proporcional à desproporcionalidade dele, com a qual ele iria viver nas selvas da América ou qualquer outro lugar deserto de seres humanos, para que os dois fossem "felizes para sempre" sem que o planeta se importunasse com a presença deles.

Razoável, não? Bastaria que o Dr. fizesse essa "noiva" estéril, e ficava tudo de boa. Mas nããão, emo que é emo TÊÊÊM QUE SURTAR. E o nosso Dr.zinho surta em escala industrial, por que não poderia infligir ao mundo o horror de tal casal procriando (lembrem-se, bastava o imbecil não por útero na tal Eva que não haveria problemas) e que ele não poderia profanar mais túmulos e mais cadáveres (Alôôô-ôu!!! Quem faz um cesto faz um cento, seu fresco!), e se recusa terminantemente a atender ao pedido do monstro.

Péssima idéia, amiguinhos. Mostrando uma determinação férrea e uma força de espírito inquebrantável, o "monstro" avisa: "Te dou um prazo e, ao final dele, das duas uma. Você pode me dar essa companheira dentro de X dias e eu parto com ela para viver o amor, como eu mereço pois todo ser vivo merece, longe da humanidade para não perturbar a paz de quem quer que seja. Todos vivem felizes para sempre. Ou você pode insistir em empatar a minha alegria e me condenar a ser sozinho. Daí eu te devolvo igualzinho o que você fez. Se eu for infeliz, tenha a certeza de que te farei infeliz em triplicata, por que eu destruirei a ti e a tudo que te é caro." (Bom, de novo, não foram exatamente essas palavras, por que já li tem algum tempo, mas a mensagem foi bem por aí.)

Adivinhem se nosso nobre de plantão não resolveu bater pézinho contra uma criatura de uns 3 metros de altura e força hercúlea... Ganha mais uma estrelinha no caderno quem disser que sim. E o que é pior, depois de dar um gostinho à criatura, começando a fazer a monstra. Pois é isso mesmo, primeiro ele até é razoável e começa a fazer a "noivinha", mas aí tem um belo dum acesso de emice purpurinada galopante e destrói a "Eva" no meio do caminho. Detalhe, o monstro estava assistindo pela janela e viu tudo.

Óbvio que o monstro simplesmente ficou prostituto da existência dentro das cuecas e cumpriu sua palavra (merece meu respeito total, admiro quem tem palavra), arrebentando a vida de Victor Frankenstein de cima a baixo, fechando com chave de ouro ao entregar-lhe o cadáver de sua noiva para que Victor fizesse a partir do presunto fresquinho uma Eva para ele: notem, o "monstro" pune com rigor draconiano mas dá uma segunda chance!

Victor SURTA DE NOVO e, depois de mais um tantão de coisa, o monstro puxa o carro deixando indicações de onde foi passar o resto de sua existência solitária, caso Victor quisesse virar hominho e tirar satisfações. Victor finalmente vira hominho e vai atrás, e o monstro o faz de tonto num jogão de gato e rato bem engraçado.

Finalmente o Victor fica dodóizinho e vai pras cucuias. O monstro chora por que, afinal, aquele emo imbecilóide era o "pai" dele e perder pai dói. Para encerrar, o monstro resolve que não tem mais por que continuar uma existência solitária e sem sentido e parte, garantindo que vai se matar e deixar a humanidade em paz (pai emo, filho emo!). E todos morrem infelizes para sempre!

Falou, pessoal, daqui não sei quantos dias eu fecho o post de Economia Ecológica. Até a próxima!

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