26 de agosto de 2009

A quanto tempo, não? Economia Ecológica 3.

Observação em 11/04/2014

Atenção, novos leitores: esta postagem será mantida apenas para fins de registro histórico, pois como alguém que gostaria de se tornar um bom cristão algum dia eu finalmente me manquei de que DEUS PROVERÁ e, portanto, essa estorinha de Ecologia é só um nome fofo para satanismo (não confiar no amor de Deus foi o que fez Lúcifer cair).

Senhores, bom dia.
Em primeiro lugar, desculpem o colossal atraso.
Agora, vamos ao último post sobre economia ecológica, que será deveras curto, composto por alguns comentários e opiniões.
Começo reforçando (ou apresentando, nem lembro) o conceito de "crescimento deseconômico". Toda produção, seja de produto ou de serviço, implica tanto em uma utilidade marginal (benefícios resultantes da produção da unidade mais recente deste produto ou serviço) quanto em uma "desutilidade" marginal (prejuízos - geralmente sociais, humanos e/ou ambientais). A utilidade é decrescente (cada unidade a mais traz menos benefícios) e a desutilidade é crescente.
O problema acontece quando a escala de produção de alguma coisa finalmente atinge o ponto em que utilidade = desutilidade. "Crescer" em termos crematísticos (aumentar ainda mais a produção em termos quantitativos) a partir desse ponto significa "descrecer" em termos oikonômicos (o meio ambiente chora e a soma dos prejuízos ultrapassa a dos benefícios para todo mundo).
Uma medida de fácil acesso para se verificar se a economia global como um todo está crescendo ou descrecendo é a pegada ecológica, que mede quanto gastamos de recursos naturais e de capacidade de recuperação do meio ambiente, e tem dados disponíveis no site (em inglês): http://www.footprintnetwork.org/en/index.php/GFN/
Adivinhem se já não estamos ladeira abaixo?
Meu outro comentário é sobre uma modinha pavorosa que se abateu sobre as melhores cabeças pensantes da área, que é o conceito de Economia do Hidrogênio. Essa idéia consiste em acreditar que Hidrogênio gasoso é um combustível (está disponível na natureza para ser extraído ou produzido de forma rápida e fácil para uso como insumo energético) e substituir os combustíveis fósseis por esse gás.
O pequeno problema é que a 2ª Lei da Termodinâmica é inexorável, meus amigos. A cada vez que temos uma transformação energética (conversão de uma forma de energia em outra), temos uma perda de "energia disponível"/exergia. Ou seja, toda conversão de energia resulta em geração positiva e não-nula de entropia e em "desperdício de energia". Perde-se capacidade da energia de produzir trabalho útil (que é a definição de exergia).
Acontece que, a menos que se encontre um outro meio de produzir hidrogênio gasoso que não seja a eletrólise da água ou a reforma catalítica de outros combustíveis, toda produção de hidrogênio para uso como insumo energético implica em conversões energéticas adicionais e desnecessárias. A eletrólise gasta uma eletricidade que poderia ser usada para outra coisa, e a reforma transforma quimicamente um combustível que já poderia ser usado para outra finalidade em sua forma original.
As únicas opções que me vêm à mente são a fotólise da água (forma de aproveitamento de uma exergia solar que não nos estaria disponível de outro modo) e a engenharia genética de microorganismos produtores de H2 gasoso (idem, mas pouco provável, já que seriam microorganismos dedicados a dar um passa-moleque efetivo na 2ª Lei, bem mais forte que aquele passa-moleque aparente comum a toda forma de vida).
Enfim, hidrogênio não é combustível, é vetor energético (ou "bateria", se vocês preferirem). H2 gasoso é um modo de armazenar energia, não um insumo energético propriamente dito.
Assim sendo, qualquer aplicação do hidrogênio em que o uso de um vetor energético (seja o H2 ou qualquer outro) não seja imprescindível (ou seja, onde não for realmente necessário armazenar energia) é contraproducente, e há muitos vetores energéticos menos dispendiosos e trabalhosos que o uso deste gás, que deve ser armazenado ou em hidratos metálicos (tecnologia complexa cuja manufatura implica em gastos energéticos consideráveis) ou em tanques pressurizados e resfriados (gasto energético colossal).
Portanto, falar em Economia do Hidrogênio, a menos que se façam ressalvas fortíssimas e toda uma série de explicações, é no mínimo um sinal claro de despreparo técnico.
Finalmente, um comentário pessoal:
- "Me recuso a sequer aprender a dirigir enquanto os veículos híbridos elétrico/biocombustível não chegarem ao Brasil com preços minimamente acessíveis às classes C e D!".
Sério, dirigir em outras condições, salvo exceções muito específicas, é um ato de um egoísmo bárbaro. O transporte público atende a grande maioria das necessidades, e o fato de ele ser deficitário e desconfortável deve-se, em grande parte, à pouca demanda por parte de pessoas esclarecidas e dotadas da capacidade de influenciar o mundo ao seu redor. Se mais pessoas capazes de interferir nos processos decisórios envolvidos usassem transporte público, mais pressão haveria no sentido de melhorar seu fornecimento.
Fora isso, o automóvel ocupa um espaço de pista por passageiro muito maior que o ônibus, e o transporte ferroviário/metroviário gasta muito menos energia por (passageiro transportado) x (distância percorrida). Carros estragam o trânsito dos ônibus e motos estragam o trânsito de todo mundo (costurando entre os outros veículos, reduzem a velocidade média de todos os outros motoristas).
E o que o transporte público não atende, o táxi resolve. Ponha na ponta do lápis a despesa fixa com um automóvel, somando combustível, seguro e impostos, e compare com o custo mensal de usar um táxi para as exceções e transporte público para os deslocamentos mais comuns.
Até o próximo post, se houver!

10 de agosto de 2009

Literatura 1.1

Senhores, boa noite.

Seguinte, terei que fazer meio post por semana, que estou com um trabalho bacana pra fazer e o tempo está todo investido.

Mas dá para escrever meia postagem de vez em quando.

Então, como eu tinha prometido e vou ter que cumprir atrasado, vambora resenhar mais três livros.

Vamos começar com The Portrait of a Lady, por Henry James. A impressão inicial é de algo meio parnasiano, com todas aquelas descrições ultra-detalhadas e maneirismos estilísticos. Na seqüência, você começa a achar que está lendo uma obra da primeira fase do Romantismo, com aqueles personagens todos tããão perfeitos e nobres. Mas depois que você conhece melhor a Isabel e se familiariza um pouco mais com o Ralph Touchett, percebe que está diante de um autor que gosta de trabalhar sutilezas psicológicas e filigranas emocionais.

Tudo construído com cuidado, como uma partida de xadrez. Cada personagem tem um papel a cumprir, por mais aparentemente inútil que possa ser no começo (Henrietta Stackpole é o exemplo máximo de personagem que você só vai perceber que é necessário para o desenrolar do livro lá pelo final, onde só ela mesma poderia cobrir a função que ela cobriu).

Resumindo beeem resumido, é a história de uma personagem que se lascou-se sozinha por si mesma própria. Pelo menos ela percebe isso e se porta com dignidade, temos que admitir. Gosto de personagens coerentes.

Outro ponto interessante do livro é que, embora alguns personagens sejam claramente "planos" (pelo amor do milho, alguém me explique o que é aquele Caspar Goodwood!), os vilões são deliciosamente matizados em tons de cinza. Descobrir que Gilbert Osmond é o oposto diametral de tudo aquilo que ele prega, e perceber que se ele visse a própria alma no espelho seria capaz de morrer de desgosto com a breguice do que veria, simplesmente não tem preço. Já Mme. Merle é uma das melhores anti-heroínas que já vi em muito tempo.

Continuando com os spoilers, saber só lá pelo fim do livro que Mme. Merle é a mamãe de Pansy é outra surpresa de virar a cabeça do leitor de avesso. Já vi pai largar filho com a mãe, mas mãe soltar filho na mão do pai, e nas condições em que a gente ver acontecer no livro, é uma senhora surpresa.

Mas analisando nossa personagem principal, digamos que Henry James passa a impressão de ser um tremendo dum machista. Super discreto, elegantíssimo, demora-se meio livro a se perceber isso, mas temos a nítida impressão de ser ele de um machismo cruel. A Isabel se lascou por conta própria simplesmente por ser "uma mulher que quer tomar conta do próprio nariz".

Vejam de onde me pareceu isso: ela rejeitou dois excelentes partidos por que ao casar deixaria de ser uma pessoa com valor individual por si mesma (Isabel Archer) e passaria a ser "apenas" a Mrs. Goodwood ou a Lady Warburton. Quando seu primo Ralph resolveu, muito inocentemente, lhe dar asas a ver o quão longe voaria, caiu direitinho na arapuca de Merle e Osmond, com um sorriso nos lábios, crente que estava abafando!

Pois muito bom, casou por amor e espírito de nobreza com um cidadão que, além de aproveitador, parasita e ingrato, ainda passou a dedicar sua existência a destruir o espírito dela. Pffft... Sente-se como se Henry James dissesse a sua protagonista, mais ou menos ao longo dos 10 últimos capítulos, rei-te-ra-da-men-te: "Bem feito, mulherzinha! Quem mandou querer ser independente? Agora toma! Bem-feei-tooo! Lá-lá, lá, láá, láá... lááá!!!".

Mas a uma leitura mais atenta, compreende-se que é exatamente o contrário. Por que é essa saraivada toda contra o espírito dela, mas Isabel segue até o amargo fim ali, firme, suportando tudo com um estoicismo espartano. O modo como ela aprende a contornar Osmond ao estilo zen ("Água não passa por cima de pedra, dá a volta") e salva as peles de Pansy e de Lord Warburton de caírem de focinho em um casamento arranjado que os mataria de aborrecimento por toda a eternidade é de um brilhantismo a parte.

E o final, então, é para aplaudir em pé. Despachar Caspar depois de todas as cartas na mesa e voltar para sofrer as pedradas e flechadas do destino adverso por amor à decência, à integridade de seu espírito e talvez até em sacrifício pela INOCENTE ÚTIL que é a coitada da Pansy foi encerrar o livro com fecho de ouro!

Agora, a dois livros não tão bons, embora clássicos. Duas obras seminais no gênero terror, mas que atualmente só têm valor histórico.

A primeira é o "Drácula" original, de Bram Stoker. Personagens planos e mal construídos, Drácula caricato, "noivas do Drácula" jogadas ali a esmo como um pedaço de roteiro mal costurado e trechos efetivamente blasfemos.

Ora faça-me o favor, então usa-se "massa de hóstia consagrada" para fazer "círculos" ou "barreiras" de proteção, como se fossem os círculos mágicos de conjuradores de demônios? Tenha a santa paciência, quase larguei com o livro pela janela quando cheguei nessa parte...

Fora isso, o comportamento das moças é histérico e o do herói do livro mais ainda. O único personagem interessante foi o de uma moça que, virando vampira, andava com crianças pela noite a la Michael Jackson mas não as "bebia".

A segunda é o "Frankenstein" original, de Mary Shelley. O livro é decididamente EMO!
Dr. Victor Frankenstein era um emo patético que desmaiou como uma menininha quando seu monstro se ergueu, animado pelos relâmpagos.
A família "protegida" pelo monstro é uma família de conto de fadas, todos de uma bondade de comercial de margarina.
E o "monstro", Ah, senhores!, o "monstro" é um capítulo à parte.

Vêm ao mundo com "alma" de criança, sem saber falar e sem noção de fanta-uva na vida. Até aí óquêijo, tudo belesminha. Afinal, apesar do tamanho monstruoso e das formas grotescas (foi montado com peças de gigantes ou o quê?), era um "recém-nascido" (ou "recém-morto-vivo", sei lá).

Mas ao parar na cabana ao lado da família de camponêses pobres que ele resolve ajudar e proteger (índole quase angélica, muito mais humano que aquele arremedo de nobre que é o Dr. Frankenstein), aprende rapidamente (só de ver e ouvir) a falar, ler e escrever, tocar flauta e filosofar como um verdadeiro filósofo teórico alemão. A única explicação que me vem à mente é que o Dr. tenha acidentalmente pego o cérebro de um luminar da ciência ou de um grande pensador e com o tempo as memórias residuais tenham começado a vir à tona, reativadas.

Até aí, está tudo mais ou menos bem estruturado, mas aí o "monstro" (cafiaspirina cruz, queria que a Sra. Shelley tivesse dado um nome para ele, por que é de longe o personagem mais humano do livro inteirinho) descobre que não tem lugar para ele no mundo, já que as pessoas (mesmo as melhores) tem uma tendência desagradável a julgar livro pela capa e a encadernação dele é realmente das piores.

Numa decisão de uma sabedoria espantosa, resolve que quem faz a agada é quem tem a obrigação de limpar, e parte em busca de seu criador, para que ele dê um jeito na baderna.

Só que dá azar ao encontrar com o irmão mais novo do Dr., e o moleque acaba morrendo toscamente. O monstro sai de fininho, no melhor estilo "Filho feio não tem pai", e acaba sobrando para uma moça lá do feudo. No pior estilo "comédia de erros", só que dessa vez é tragédia de erros, mesmo.

Daí o Dr. vai tirar satisfação com o monstro, achando que a criatura tinha matado o moleque e incriminado a moça de propósito. Ao encontrar o monstro este, muito lhanamente, conta todas as suas desventuras até o momento e pede uma "Eva" proporcional à desproporcionalidade dele, com a qual ele iria viver nas selvas da América ou qualquer outro lugar deserto de seres humanos, para que os dois fossem "felizes para sempre" sem que o planeta se importunasse com a presença deles.

Razoável, não? Bastaria que o Dr. fizesse essa "noiva" estéril, e ficava tudo de boa. Mas nããão, emo que é emo TÊÊÊM QUE SURTAR. E o nosso Dr.zinho surta em escala industrial, por que não poderia infligir ao mundo o horror de tal casal procriando (lembrem-se, bastava o imbecil não por útero na tal Eva que não haveria problemas) e que ele não poderia profanar mais túmulos e mais cadáveres (Alôôô-ôu!!! Quem faz um cesto faz um cento, seu fresco!), e se recusa terminantemente a atender ao pedido do monstro.

Péssima idéia, amiguinhos. Mostrando uma determinação férrea e uma força de espírito inquebrantável, o "monstro" avisa: "Te dou um prazo e, ao final dele, das duas uma. Você pode me dar essa companheira dentro de X dias e eu parto com ela para viver o amor, como eu mereço pois todo ser vivo merece, longe da humanidade para não perturbar a paz de quem quer que seja. Todos vivem felizes para sempre. Ou você pode insistir em empatar a minha alegria e me condenar a ser sozinho. Daí eu te devolvo igualzinho o que você fez. Se eu for infeliz, tenha a certeza de que te farei infeliz em triplicata, por que eu destruirei a ti e a tudo que te é caro." (Bom, de novo, não foram exatamente essas palavras, por que já li tem algum tempo, mas a mensagem foi bem por aí.)

Adivinhem se nosso nobre de plantão não resolveu bater pézinho contra uma criatura de uns 3 metros de altura e força hercúlea... Ganha mais uma estrelinha no caderno quem disser que sim. E o que é pior, depois de dar um gostinho à criatura, começando a fazer a monstra. Pois é isso mesmo, primeiro ele até é razoável e começa a fazer a "noivinha", mas aí tem um belo dum acesso de emice purpurinada galopante e destrói a "Eva" no meio do caminho. Detalhe, o monstro estava assistindo pela janela e viu tudo.

Óbvio que o monstro simplesmente ficou prostituto da existência dentro das cuecas e cumpriu sua palavra (merece meu respeito total, admiro quem tem palavra), arrebentando a vida de Victor Frankenstein de cima a baixo, fechando com chave de ouro ao entregar-lhe o cadáver de sua noiva para que Victor fizesse a partir do presunto fresquinho uma Eva para ele: notem, o "monstro" pune com rigor draconiano mas dá uma segunda chance!

Victor SURTA DE NOVO e, depois de mais um tantão de coisa, o monstro puxa o carro deixando indicações de onde foi passar o resto de sua existência solitária, caso Victor quisesse virar hominho e tirar satisfações. Victor finalmente vira hominho e vai atrás, e o monstro o faz de tonto num jogão de gato e rato bem engraçado.

Finalmente o Victor fica dodóizinho e vai pras cucuias. O monstro chora por que, afinal, aquele emo imbecilóide era o "pai" dele e perder pai dói. Para encerrar, o monstro resolve que não tem mais por que continuar uma existência solitária e sem sentido e parte, garantindo que vai se matar e deixar a humanidade em paz (pai emo, filho emo!). E todos morrem infelizes para sempre!

Falou, pessoal, daqui não sei quantos dias eu fecho o post de Economia Ecológica. Até a próxima!

5 de agosto de 2009

Literatura 1

Senhores: desculpem o atraso.

Graças ao bom Deus, estou com um bom conjunto de textos para traduzir ($$ no bolso sempre é bom!) e meu tempo ficou apertado para postar.

Felizmente, o post atrasado é da família dos abobrinhentos, então é só ligar o módulo Janete Clair e sair digitando.

Basicamente, vou escolher meia dúzia dos livros que já li e falar a respeito deles: atenção, vai rolar spoiler a rodo.

Vamos começar com meu autor favorito em língua inglêsa, Thomas Hardy.

Em linhas gerais, esse vitoriano (inglês de 1800 e muito) adorava criar protagonistas super gente boa, desses com os quais a gente se identifica logo de primeira, e depois passar o livro todo destruindo a vida do(a) infeliz. Happy ending é algo que você definitivamente NÃO encontrará em livros dele, até onde me é dado saber.

Por enquanto, já li deste autor:

  • The melancholy hussar and other stories;
  • Tess of the D'Urbervilles; e
  • Jude, the obscure.

O primeiro é uma coletânea de contos, apresentando os temas favoritos do autor: preconceitos vitorianos e o quanto eles são estúpidos e ferram a vida das pessoas, amores mal-fadados, desilusões, fracassos e esperanças frustradas. Pessoas boas que não se podem casar por causa de convenções sociais artificiais e nojentas, projetos de carreira destruídos por mesquinharias e pequenez humana e outras coisas do gênero.

Todos os heróis e protagonistas morrem ou levam uma vida de fracasso destroçante, enquanto que os vilões e personagens secundários nojentos ficam de boa. Uma tremenda coletânea de lições de vida real, à época de sua primeira publicação.

O segundo é a história de uma jovem camponesa que, por causa de pais burros e sem-noção, acaba caindo nas mãos de um canalha endinheirado que a embucha e joga na rua.

Sem brincadeira! O pai da Tereza Durbeyfield (Tess, para os íntimos) era um pinguço inútil, e teve a má sina de cruzar caminho com um pároco (anglicano, lembrem-se que estamos na Inglaterra vitoriana) que gostava de desperdiçar seu tempo estudando genealogias. O tal pároco caiu na imbecilidade de informar o bebum que ele descendia de nobreza normanda, do clã dos D'Urberville. Pois o cachaceiro volta pro bar, bebe fiado e manda que lhe carreguem de volta para casa em liteira, só para vocês verem o tamanho da monguice do distinto.

Daí para a frente, só ladeira abaixo para a coitada da Tess. O malucão descobre um pouco mais para diante que há uma família atendendo pelo nome de D'Urberville alguns condados adiante (spoiler do spoiler: eram novos-ricos que compraram o sobrenome para dar alguma dignidade ao dinheiro), e convence a família toda de que seria uma boa mandar a Tess, que era a filha mais velha, para falar com eles e pedir uma ajudinha, já que são parentes.

Nem para a mãe dizer algo, por que Joana Durbeyfield, embora não bebesse, era tão cozida quanto o maridão. Pobre Tess... Lá vai ela, que encontra logo com o "homem da casa": Alec D'Urberville, um filhinho de mamãe (viúva, cega e desinformada - Alec fazia o que quisesse com a grana e com as propriedades, criadagem inclusive) comedor de empregadas.

Pois Alec convence Tess a ficar em uma granja de frangos, como se mamãe D'Urberville soubesse disso.

Algumas páginas adiante, Alec curra Tess.

Mais algumas páginas adiante, Alec enjoa de Tess, que volta grávida para sua aldeia. E isso com o povo todo achando que ela ia casar com o primo Alec! ...kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk...

Tess tem seu filhote, trabalha na roça feito uma condenada, vê seu filhote morrer, continua trabalhando na roça feito uma condenada e finalmente tem que migrar para outro condado para poder continuar trabalhando sem que o resto de sua família se ferre com a sua desonra (vitorianos escrotos...).

Chegando no outro condado, trabalha-trabalha-trabalha até que aparece um sujeito aparentemente bacana. Ela tenta não gostar dele, por que sabe a cabeça do macharal do povo e do tempo dela, mas não consegue e cai de quatro e de boca no capim. O camarada, sem saber da história dela, cai igualmente aboxonado.

Ela tenta avisá-lo de seu passado, antes que aconteça algo mais grave, mas nãããão, não haveria um livro de Thomas Hardy se ela conseguisse avisá-lo a tempo. Os dois casam, ela finalmente conta a ele seu infortúnio (detalhe, depois de ELE ter dito que tinha passado dois dias comendo uma fulaninha sem casar a um par de anos atrás) e ele SURTA.

Angel Claire (esse é o nome do tal sujeito) simplesmente SURTA, dorme em cama separada, quase mata Tess em um ataque de sonambulismo e some para o BRASIL, vejam vocês. Passa um ano aqui antes de voltar, e nunca dá notícias para a Tess, que passa uma vida de cão chupando manga embaixo de pé de tamarindo, trabalhando feito uma escrava para se sustentar em um condado com o clima mais escroto de toda a Inglaterra.

Quando Angel Claire está para voltar do Brasil, Alec D'Urberville (por que filho da puta que é filho da puta SEMPRE VOLTA NA PIOR HORA nos livros do Thomas Hardy) reaparece, inferniza a vida da Tess e compra a família todinha dela para convencê-la a se tornar sua amante (já que esposa ela já era do Angel Claire). A infeliz da Tess resiste um par de meses, até que Alec solta a última cartada: "Queres que teus irmãos e irmãs tenham vidas bacanas e felizes, deixe que eu compro isso pra eles, basta que você seja minha". Bom, como o pai morreu e a mãe é uma encostada inútil do cão, Tess não teve escolha.

Pois depois disso é que Angel finalmente resolve PERDOAR Tess (olhem a desfaçatez do menino... Ah, uma jaula!) e procurá-la. Encontra-a morando com Alec, e ela o informa de toda a infelicidade que se abateu sobre ela. Pois é, desgraça pouca para protagonista de T. H. é bobagem.

Angel vai embora, dando a entender que se não fosse por ela estar com Alec estaria tudo bem, por que mesmo que se fossem agora a infâmia os perseguiria e yadda-yadda-yadda.

Na seqüência, Tess pira na batatinha, cata uma peixeira na cozinha, chama Alec de Conde Drácula e enfia a peixeira até o cabo no coração dele. Troca a roupitcha e sai alegre e lampeira procurando Angel.

Encontra-o, conta o que fez, fogem juntos por um tempo, acham um chalé abandonado e vivem uma pequena lua-de-mel (um minutinho de alegria pra coitada da protagonista, já que ela já tinha escolhido morrer, já explico).

Saem do chalé quando percebem que sua presença nele foi descoberta pelos proprietários, mas a polícia finalmente os alcança. Antes de serem alcançados, Tess convence Angel a procurar sua irmã mais velha (mais nova que a Tess, mas mais velha que o restante da irmãozada toda) e casar com ela - a moça ainda era pura, então para ela tava tudo beleza. O lance é que Tess sabia que quem mata um rico sempre vai pro vinagre, mesmo estando com a razão, e tinha aceito ir pro vinagre para que a infâmia não alcançasse Angel Claire (é o amor, minha gente!).

O livro termina com Angel e a irmã de Tess olhando para a Torre de Londres (prisão máxima para condenados à morte) e vendo o hasteamento da bandeira negra que indica que um condenado acabou de ser executado.

Moral da história, Angel Claire babaca fica com a irmã cabacinho da Tess e termina o livro lépido e fagueiro, enquanto que a pobre coitada da Tess termina sua vida de aflições sendo degolada na cadeia.

Finalmente, o terceiro: Judas, o Obscuro.

Nunca vi um protagonista apanhar tanto num livro, nem a Tereza de Tess of the D'Urbervilles.

O cara nasce pobre e quer fazer carreira acadêmica. Bom, já começou mal, por que na Inglaterra vitoriana mobilidade social era lenda. Mas o distinto (suuuper gente boa, como todo protagonista de T. H.) era esforçado, trabalhava feito um mouro, ganhava seu sustento dignamente e torrava toda a sobra com livros, aprendendo grego e latim na unha.

Se me lembro bem, ele era entalhador de pedras (stone mason), e especializado em entalhe de lápides mortuárias: meio macabro, tal e coisa, mas mão de obra técnica especializada para a época. Dava para tirar um sustento legal sendo solteiro, trabalhando com isso e com entalhes e restaurações de detalhes arquitetônicos em pedra de cantaria em construções antigas: castelos, universidades, catedrais e coisa e tal.

Tava lá ele, estudando sozinho na boa, trabalhando, juntando umas economias para quem sabe um dia ir para o condado vizinho pedir licença para assistir umas aulas na universidade local, depois de mostrar o quanto era esforçado e já tinha aprendido sozinho, enfins, tudo se encaminhando para não ser um livro do T. H.

Mas eis que o autor bota no caminho do nosso amigo uma garota safada e dadeira que o tira dos livros para fazer nheco-nheco. Problemas? Dois: 1) cuidar de esposinha fogosa tira o tempo livre que ele tinha para os estudos e 2) a grana dele só dá para cuidar de um casal sem sobra para livros ou qualquer tipo de luxo.

Mas vocês poderiam me dizer: "Ué, o Judas que largasse dessa bestagem de querer estudar e vivesse legal como um entalhador de pedra, já que a grana da profissão sustentava o casal direito.".

O problema é que a tal mulherzinha não valia o que o gato enterra. Primeiro ela começou a infernizar com o Judas (malhar o judas com o saquito do Judas - rsrsrs), depois se não me engano resolveu lhe enfiar galha e finalmente sumiu no mundo. Foi passear no Canadá, depois de transformar a vida e a auto-estima do Judas em purê de batata.

Uma vez sozinho no mundo, Judas resolve juntar as economias e os caquinhos e reiniciar seus planos. Já que o casamento não deu certo mesmo, não custava nada esperar a poeira baixar (homem pode, né? Vitorianos escrotos...) e reiniciar de onde tinha parado. O problema era só a idade dele, que alguns anos tinham se passado nesse lero.

Nesse meio tempo, ele tinha cruzado caminho com uma prima super gente fina (atenção, em livros do T. H. você SABE que quando alguém é super gente fina esse alguém está destinado a levar trolha até o fim do livro) com a qual tinha simpatizado, mas como sujeito decente e casado ele só ficou na amizade e tchau.

Pois bom, como o primo Judas estava casado, a prima acabou casando com um mestre-escola (um velhote que não fedia nem cheirava, se fosse gente boa tinha se ferrado no livro, mas como só não fedia nem cheirava teve um destino neutro: o autor meio que esqueceu de dar um fim pro personagem dele).

Agora que estava livre e desimpedido, se reencontra com essa prima (a família tinha avisado profeticamente quando eles eram pequenos que não era pra deixar que os dois se juntassem).

Os dois se aboxonam perdidamente, juntam-se e vão viver nesse condado vizinho onde o Judas queria tentar estudar.

O Judas trabalha entalhando pedra, reformando castelo antigo e tal, a prima dá umas aulinhas pra crianças.

Até aí, vai indo, mas eis que Arabella (a tal que não valia o que o gato enterra) reaparece do Canadá (eu diria que das profundas dos infernos, mas no caso foi do Canadá mesmo) para dizer que tinha um filho e que o moleque era dele. Depois de uns 6 a 8 anos, papagaio!

O tal moleque vai morar junto com Judas, a priminha e as duas crianças pequenas que eles tiveram. Mas com a reaparição de Arabella, o juntamento dos dois passa a ser mal visto na cidade e pouca gente lhes dá trabalho e paga (por que todo mundo acreditava que Judas e a priminha eram casados, mas com o retorno de Arabella e o aparecimento desse moleque se esclareceu e se lascou tudo), o que faz com que eles, os dois filhos e o filho do Judas com a Arabella passem um tanto de aperto.

Esse moleque é o toque de Midas do Thomas Hardy na história. O garoto tinha algo entre 6 e 8 anos e era quieto, caladão, deprimido e sombrio. Como se tivesse plena consciência de toda a escrotidão da história que cercou a vinda dele ao mundo e mais um pouco. Para vocês terem uma noção do climão tenebroso em volta do moleque, o Judas e a priminha deram-lhe o apelido de "Little Father Time" (Pequeno Pai Tempo - o Pai Tempo é a figura inglêsa do Tempo como uma pessoa que detem o conhecimento de tudo o que aconteceu ao longo das eras, é algo bem depressivo de se usar como apelido para alguém, indicando alguém extremamente taciturno).

Pois um belo dia Judas volta de entalhar umas lápides e a priminha volta de dar umas aulas, e eles encontram os bebês mortos abafados com travesseiro e o nosso "luminoso" Little Father Time pendurado em uma forca, com um bilhete aos pés: "Queridos papai e mamãe, quis poupar-vos o trabalho e as aflições de terem que cuidar de nós nestes tempos difíceis em que vosso dinheiro está tão escasso e tão duro de ganhar. Assim, mandei meus irmãozinhos para o céu e me matei" (bom, não foram exatamente essas palavras mas a mensagem era essa).

A priminha enlouquece de desgosto e volta para seu mestre escola, enquanto que o Judas passa alguns meses infeliz e adoecendo de loucura, tristeza e agonia.

No fim, os dois morrem, ele por último depois de vê-la morrer sabendo que a culpa dela morrer era toda dele.

Moral da história: coma chocolate para rebater, por que depois de ler esse livro dá um ataque de depressão monstruoso.

Faz um bom tempo que li esse livro, então devo ter pulado uma porrada de detalhe, mas o essencial tá ai em cima.

Eu tinha prometido meia dúzia de livros, mas acabou de chegar mais um pedaço gordo do meu trabalho de tradução bilíngüe e vou trabalhar que ganhar dindim é bom.

Até a próxima, quando completarei esse primeiro post com mais 3 livros analisados a la SeuZéNando: muito spoiler e muita opinião torta. Beijos nas crianças!